Incompleto

E o que é completo? Existe? Algo que realmente consiga estar o tempo todo sem faltar absolutamente nenhum pedacinho? Sabe que não.

A gente vive desde sempre incompleto. Mesmo que durante a maior parte do tempo não tenha consciência ou nem mesmo se importe com isso. Mas a verdade é que sempre falta um pedaço. E para o desespero dos pessimistas, isso não quer dizer que seja algo ruim. Até porque, ter que completar algo é um objetivo, e portanto, é bom.

Mas a realidade é que a gente caminha deixando pedaços por tudo. Da mesma forma que a pele vai se despedaçando, assim vamos nós. A cada passo, a cada dia, a cada experiência. Um pedaço fica.

Muitas vezes ele é substituído por um novo pedaço, o que é tipo a situação ideal. Mas infelizmente, 90% do tempo, a gente só vai perdendo pedaço.

E a maior parte das vezes a gente subestima esses fragmentos. Não notamos sua importância. E seguimos em frente. Firmes, fortes e sem a menor noção que estamos deixando de existir. Deixando de ser.

O processo de dissolução que inevitavelmente vivemos é injusto e desumano. Perdemos nosso pedaços com as melhores das intenções. Mas perdemos. Pedaço por pedaço. Até um dia pararmos na frente do espelho e não termos a menor ideia de quem é aquela criatura nos olhando. Até termos nojo do espelho.

A partir daí… cada um cada um.

No meu caso, o dia que olhei do espelho aquela abominação e concluí que meus filhos iriam achar que aquela bosta era o pai deles foi quando acabou.

E não é fácil acabar. Pois tu está, de certa forma, decretando o fim de ti mesmo. De uma versão de ti que não deu certo. E não é legal aceitar que tu não deu certo. Mas faz parte. E é necessário.

Daí tu pesa tudo, considera as variáveis, sente dor, e decide ir em frente. Vai ser melhor pra todo mundo. Vai dar uma trabalheira do caralho, mas é o caminho.

Tem um ponto que tu corre o risco de não entender que o que quer que tenha acontecido até ali foi e sempre será importante. Uma parte fundamental do que vai fazer de ti tu de novo. Mas meio que dói aceitar. Pois faz parte da derrota.

Mas a verdade é que dar errado faz parte de dar. E deu. Errado, mas deu. E se tu não aprendeu porra nenhuma é porque tem mais que se fuder mesmo. Mas se tu aprendeu, vai aprender a respeitar a dificuldade e todo mundo que fez parte dela. E por pior que seja, vai ser como ter ido pra guerra junto. Talvez tu não passe mais tempo com aquela pessoa, mas ela lutou do teu lado e tu vai respeitar.

Depois disso é tocar pra frente, firme e forte e descobrir o que é tu no meio dessa porra toda. Pois nem tudo é tu. E nem tudo é quem tu achava que era. E peneirar essa porra toda não é pra qualquer um. Mas é pra ti, se tu estiver afim pra caralho.

E na real, se não estiver, não devia nem ter começado.

No meu caso, que tenho dois mini-mes crescendo e avaliando cada merda que eu faço… ser eu, por mais que isso possa ser julgado ou discutido, é importante. Pois quero que um dia eles olhem e pensem: aquilo lá, seja o que for, é o meu pai. E eu adoro essa porra toda.

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